quinta-feira, 15 de maio de 2014

[URUGUAI] Comunicado público da Coluna Cerro-Teja a respeito do último 1º de Maio em Montevidéu


Retirado de: http://coletivoanarquistalutadeclasse.wordpress.com/2014/05/12/uruguai-comunicado-publico-da-coluna-cerro-teja-a-respeito-do-ultimo-1o-de-maio-em-montevideu/

Difundimos a tradução do comunicado público da Coluna Cerro-Teja a respeito do último 1º de Maio em Montevidéu, ocasião que a Coluna queimou um boneco de policial em protesto contra a repressão nos bairros e o projeto de lei de redução da maioridade penal. Em função da ação, companheiros estão sendo intimados a depor judicialmente.

Toda solidariedade a Coluna Cerro-Teja.

Contra a repressão policial nos bairros e a redução da maioridade penal, aqui, no Uruguai e em qualquer canto do mundo!
Não ta morto quem peleia!

Federação Anarquista Gaúcha – FAG

Montevideo, 3 de maio de 2014.


À Opinião Pública:

Por ocasião da queima de bonecos no 1º de Maio nossa Coluna tem sido mencionada e atacada em meios de comunicação e em declarações de representantes do governo. Nos vemos na obrigação de responder e esclarecer algumas questões.

A Coluna Cerro Teja marcha de forma interrupta em direção ao ato do 1° Maio convocado pela central dos trabalhadores há 31 anos.

Foi durante o ano de 1983 que trabalhadores nossos queridos bairros Cerro e La Teja, tomaram as ruas ainda na ditadura, exigindo liberdade para os presos políticos, denunciando o desaparecimento de lutadores sociais, o desaparecimento de crianças pela ditadura militar e repudiavam o regime então existente.
Desde então nossa Coluna tem se manifestado em reiteradas ocasiões sobre problemas que tocam a classe trabalhadora e nosso povo no marco da comemoração do 1° de Maio. Durante todo esse tempo estiveram participando da mesma um conjunto de sindicatos e organizações sociais. Nomearemos por hora algumas daquelas que nos traz a nossa memória com maior facilidade, sabemos que provavelmente algumas ficam no caminho…

Operários da COLAGEL, FOICA (Federação dos Operários da Indústria Frigorífica), ADEMU (Sindicato de Docentes), ADES (Sindicato de Profesores), FANCAP (Sindicato de ANCAP – Petroleiros), STIQ (sindicato dos Quimicos), UNTMRA(sindicato Metalúrgico), SUATT (Sindicato dos Taxistas), UTAA(Sindicato dos trabalhadores do corte de cana de açúcar de Bella Unión), SUNMA (Trabalhadores da Pesca), FFOSE (sindicato dos trabalhadores da OSE – Obras Sanitárias do Estado), UNOTT (Trabalhadores do Transporte), SAG (Sindicato dos Operários Gráficos), Mães e Familiares de Presos e Desaparecidos, Obreros de Niboplast(fábrica recuperada pelos trabajadores –ramo plástico), Plenaria Memoria y Justicia, Coordinadora de Estudiantes, CEIPA (Gremio dos estudantes do IPA), Gremio do liceo 11, Gremio do liceo 61, Gremio do liceo Bauzá, AFUTU (Sindicato dos Trabalhadores da UTU – Universidade Técnica do Uruguai), PROMOPEZ (indúsdria pesqueira), FUCVAM (Federação Uruguaia de Cooperativas de Moradia por Ajuda Mútua), ADEOM (Associação de Empregados e Operários Municipais), COVITEA (Cooperativa de moradia de la Teja), _COVIDE (Cooperativa de moradia do CERRO, UN LUGAR EN EL MUNDO (Cooperativa de moradia do Cerro), COVICENOVA(Cooperativa de moradia do Cerro), Movimiento de Moradores en contra o Chumbo e pela Vida, EL PUENTE FM (Radio Comunitaria de LA Teja), DE LA VILLA FM (Radio Comunitaria del Cerro), EN CONSTRUCCIÓN (Radio Comunitaria de Santa Catalina), LA KLASISTA (Radio Comunitaria de la Aguada), Bazar de trocas de Santa Catalina, Bazar de Trocas “Casa de la Amistad”, Bazar de Trocas “Santa Romero”, Refeitório Infantil do Cerro, Ateneo del Cerro, Ateneo Carlos Molina (La Teja), Ateneo Germinal (Villa Colón e Lezica), Ateneo Pocho Ríos(Santa Catalina), Movimiento de Moradores contra o Porto Militar do Cerro, Comissão em defensa da Agua e da Vida, Movimiento de Moradores contra impunidade, Comissão nacional contra a Impunidade, Comissão de defesa da educação pública, comissão de defesa de ANCAP.

Nossa marcha tem se mantido ano após ano encabeçada por distintos sindicatos em conflito, pela denúncia de distintas problemáticas sociais que afligem nossos bairros e o conjunto de nosso povo. Também, ano após ano várias quadras de moradores destes bairros operários, que conhecem o sacrifício e a luta tem marcado presença.

Aqui também nomearemos rapidamente algumas das pautas encabeçadas pela Coluna nestes 31 anos.

Apoio a sindicatos em conflito, pronunciamento e participação em Todos os plebiscitos populares, participação ativa e sustentada em todos os temas relacionados com a violação dos Direitos Humanos, a liberdade de expressão, rechaço à invasão norte-americana do Irak, entre outras.

Neste ano, como já mencionamos acima, a nossa Coluna esteve pautada por um tema demasiadamente sensível e preocupante para nossos bairros. Estamos nos referindo a violência e abuso policial que se vivencia de forma cotidiana nos bairros denominados de periferia. As qualificadas, com teor de discriminação social, zonas “vermelhas”.

Não é uma problemática nova, mas nestes últimos anos tem aumentado e estes casos tem sido de público conhecimento. Sem dúvida que o assassinado do jovem Sergio em Santa Catalina é uma exemplo, mas queremos dizer que este repugnante acontecimento não é, como se busca transparecer um caso isolado, afinal de contas há um responsável direto que o executou, mas tudo o que envolveu o operativo em seu conjunto, o espancamento aos familiares, a moradores em pleno Posto de Saúde do Cerro, toda a manipulação de provas no local do assassinato, os episódios anteriores de abuso contra jovens do bairro, com ameaças, agressões, detenções, perseguições não foram levadas não foram levadas em conta na ocasião do assassinato de Sergio. Situações não muito distintas rodearam os assassinatos policiais de Santiago Yerle e Guillermo Machado.

Podíamos destinas páginas inteiras referindo-nos a casos cotidianos de prepotência policial a que nossos bairros enfrentam cotidianamente. Essa situação é conhecimento de todos, sabem muito bem disso não só nós que vivenciamos, sabem muito bem todos os políticos, todos os ministros, meios de comunicação, etc.
Agora a investida pela redução da maioridade penal que repudiamos e a queima simbólica de um boneco. A mensagem é clara, é política, é também uma linguagem. Estamos ante uma política repressiva e seu braço executor contra infância e a juventude, a ânsia por aprisionar os que são quase crianças. Esse é o fato que simbolicamente repudiou e buscou pautar a Coluna. “Nossos guris não vão para as prisões, o melhor de nosso povo não dará nenhum voto pela redução da maioridade penal” manifestaram textualmente desde a tribuna do PIT-CNT. O Cerro e la Teja tampouco darão voto algum à redução.

Mas que não se equivoquem os sindicatos policiais, eles não são nossos companheiros, tampouco os consideramos trabalhadores. Sua função, dado o posto que ocupam na estrutura do sistema, é de repressão, de golpear e reprimir o povo sempre que o exijam. Sua instituição está educada, disciplinada, infestada de valores para garantir a tarefa de zelar pelos interesses dos ricos e poderosos, dos donos deste sistema. A ordem que lhes interessa que seja zelada a cassetadas e tiros é a de suas propriedades e de seu poder.

Esses bens e poder mais os mecanismos que os sustentam. Estes que volta e meia são questionados por aqueles que se cansam das injustiças e é quando vocês saem a intervir. Os temos visto ao longo de toda história, aqui nestes bairros, espancando e arrastando pelos cabelos, algemando, estrangulando e espancando as pessoas no chão nos estádios de futebol, aos trabalhadores frigoríficos constantemente. Para mencionarmos apenas alguns casos, o paralelo 38[1] e mais recentemente o massacre do filtro[2]. Sem contar os espancamentos a estudantes em inúmeras ocasiões, em alguns casos a estudantes, pais e professores como fizeram no Liceo 70 mais recentemente. Pelo visto ali também havia delinquentes que exigiam um banheiro para seus filhos. Mais recentemente presenciamos a polícia tomando conta de todo o bairro em uma patrulha que atropelou uma criança. Foram os vizinhos que tiveram de socorrer a criança enquanto os policiais eram atendidos primeiramente pelos médicos. O repúdio dos vizinhos se transformou nisso que agora chamam perversamente de delinqüência: fecharam a ponte do Pantanoso queimando pneus, marcharam à delegacia e fizeram diversas manifestações em nosso bairro. Não senhores, vocês não são nossos companheiros, se fizessem um consulta sindical que transcendesse os “dirigentes” burocratas, vocês não estariam em nosso PIT-CNT. Chegará a hora em que as coisas terão seu devido lugar.

Uma ideología do sistema para esta etapa é elevar a primeiro plano, sobredimencionar, o tema da segurança. Os meios de comunicação criam o ambiente para dar-lhe a dimensão que necessitam, recheando com horror e sangue o revestem adequadamente para que o medo se encarreguem do restante. Por que este tema esta pautado em nosso país da mesma forma que nos demais? Que coincidência, não? O chamado neo-liberalismo semeou o mundo de miséria, raiva, desesperança. Organizou esta etapa para que cada vez uma minoría tenha mais e para que a maioria tenha cada vez menos. Uma das respostas às rebeldias e descontentos que surgem e seguirão surgindo é a montagem de dispositivos ideológicos como o chamado: Segurança. Não falam de outra segurança que a deles.

Para os de baixo se expressa no que temos visto. O aumento da tecnificação da repressão, ao inundar as ruas de policiais em nossos bairros, o endurecimento das penas para os jovens, abrir prisões e abarrotá-las. Sabe-se muito bem e experiências nos sobram em tal sentido, que não é por ai que se vai solucionar a conjuntural problemática social que padecemos. Isso sem pautarmos o problema de fundo que é o mais transcendente.

O que aquí se busca é calar as legítimas denúncias, reclamações, reivindicações. Criar espantalhos em direção aos descontentos e rebeldias. Judicializar e criminalizar o protesto. Ficou muito claro que isso não passa para aqueles que assassinaram, seqüestraram, torturaram e violaram e que seguem contando com impunidade que quase todos cobrem e amparam. Que quando surge uma juíza como Motta que busca unicamente investigar rapidamente a retiram de seu posto, encaminhando-a aos últimos rincões. Isso sim, processos para aqueles que protestam pela tamanha artimanha da corte. Impunidades e prisões de luxo. Mas outras impunidades estão sendo somadas e não dizem outra coisa se não como tudo isso funciona.
O Sr. Ministro do Interior, Bonomi afirmou que somos delinqüentes. Velha novidade para nós! Assim o sistema e seus personagens catalogaram a todos os lutadores sociais através dos tempos. Classificaram assim, recentemente, a Jose Gervasio Artigas que também era um bandido; classificaram também estes Mártires de Chicago que nestes dias recordamos que eram delinqüentes e outras coisas. Também lhe recordamos que coisas parecidas disseram a Raúl Sendic e Pocho Mechoso, lutadores que são uma referência e exemplo para todos os que lutam. E poderíamos seguir. Sim, somos destes delinqüentes, claro que sim, e inclusive conseqüentes. Seremos destes delinqüentes enquanto haja opressão, injustiça, desigualdade. Prometemos nos portar bem quando haja um ambiente de liberdade, solidariedade, novos valores e a civilização existente esteja a serviço de todos os seres humanos.


 Contra toda Impunidade, por Moradia, Saúde, Educação e Trabalho para nossos jovens.
Basta de repressão em nossos bairros.
No a redução da maioridade penal
Porque nosso 1° de maio é sempre um dia de luta, classista e combativo.

Columna Cerro-Teja


[1] Se refere as massivas greves dos “gremios solidários” que pararam o Uruguai nos anos 1951 e 1952. Na ocasião os bairros Cerro e La Teja foram sitiados pelas forças policiais e militares em função de ser nestes bairros operários onde a luta se desenvolvia com maior vigor e combatividade. Em função desse cerco, que isolava estes bairros do restante de Montevidéu, a região passou a ser chamada de “paralelo 38”, em alusão a linha divisória entre a Coreia do Norte e do Sul durante a Guerra da Coreia (1950-1953). [Nota da tradução.]

[2] O episódio conhecido como “masacre del Hospital Filtro” ocorreu na noite de 24 de Agosto de 1994 nas imediações do hospital Filtro em Montevidéu. Na ocasião milhares de pessoas faziam uma vigília no hospital contra a extradição dos cidadãos bascos Jesús Maria Goitia, Mikel Ibáñez Oteiza e Luiz Lizarride acusados pelo governo espanhol de serem vinculados ao ETA e que se encontravam internados no hospital em função de uma greve de fome. A brutal repressão promovida pelo então governo de Luis Lacalle resultou em centenas de feridos e dois mortos: Fernando Morrini e Roberto Facal. Hoje, 20 anos passados o massacre segue impune. [Nota da tradução.]

Tradução: Federação Anarquista Gaúcha – FAG

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