Texto publicado originalmente no Libera #159
CONSTRUIR PODER POPULAR!
A voz dos oprimidos nos atos de junho até a atualidade
Junho e julho foram meses de grandes
manifestações populares, onde trabalhadores, estudantes, desempregados e
diversos setores da classe oprimida foram às ruas em várias cidades do
país para lutar contra os abusos das corporações capitalistas e do
governo. A força vinda da base da classe oprimida alcançou repercussão
mundial, e como não poderia ser diferente encontrou adversários
reacionários em seu caminho: a Rede Globo, as demais mídias capitalistas
e os setores direitistas tentaram esvaziar o conteúdo social
reivindicatório das pautas das manifestações, seja com generalizações do
tipo “contra a corrupção”, ou com apelações ufanistas do tipo “o
gigante acordou”. Apesar disso, a forte pressão popular abaixou as
tarifas dos transportes em muitas cidades, representando uma vitória
incontestável do povo contra as classes opressoras.
Nos meses de agosto e setembro vimos
surgir novas mobilizações e resistências nas favelas. Locais que se
organizaram e também foram às ruas para denunciar a violência que sofrem
há décadas por parte do Estado, lacaio do capital, e que não usa balas
de borracha. Essas iniciativas geraram importantes acúmulos como:
Movimento Favela Não se Cala e o Fórum Popular de Apoio Mútuo (antigo
Favela Nunca Dormiu). Isso nos deixa como lição a necessidade de
fortalecermos os movimentos sociais desde a base.
As revoltas e indignações populares
diante da precariedade do sistema de trens também devem ser lembradas.
Com a autorização de Sérgio Cabral e do Secretário de Transportes, Júlio
Lopes, a população é tratada de forma indecente pela concessionária
Odebretch, à base de chicote. A população não aguenta mais a violência
cotidiana imposta pelo péssimo serviço oferecido. Está clara a
incompatibilidade com a qualidade no fornecimento de serviços públicos
quando são entregues ao controle de empresários, e suas máfias, que
visam o lucro e a exploração do trabalhador.
Outubro chegou e com ele romperam novas
manifestações. Há dois meses em greve, servidores dos sistemas municipal
e estadual de educação lutam por reajustes e pisos salariais dignos e
por um plano de cargos, carreiras e remunerações que valorize a todos.
Lutam por uma política de educação de qualidade contra as medidas
impostas pela Secretaria de Educação e governo, que penalizam os
servidores e aposentados. E contra o avanço de um regime meritocrático,
de lógica capitalista, que responsabiliza e joga toda a culpa pelos
problemas estruturais, e pelo caos vivido na educação pública, no colo
dos trabalhadores. O medíocre Governo PMDBista responde com ameaças e
violência, com porradas de cassetete, balas de borracha e bombas de gás!
Assim, no decorrer de uma conjuntura de
momentos de ascensos e descensos das manifestações no Rio de Janeiro, o
balanço geral é positivo. Sobretudo quando estiveram pautadas por
demandas sociais espelhadas na realidade dos oprimidos. Nota-se que uma
nova geração formada politicamente no calor das lutas e reivindicações
de rua está surgindo e reage veementemente contra as práticas
burocratizadas que desmobilizam a classe trabalhadora. Mas há ainda
muito a se fazer e construir nas bases de diversos setores populares e
categorias dos trabalhadores, onde é preciso dar a luta organizada e
cotidianamente.
A violência é a verdadeira Lei do Estado
Como já dito, a democracia burguesa não
se intimidou e fez uso de aparatos e mecanismos repressivos herdados da
ditadura. Criou a nefasta Comissão Especial de Investigação de Atos de
Vandalismo em Manifestações (extinta diante das pressões populares),
criminalizou o uso de máscaras, plantou provas, prendeu menores,
perseguiu e prendeu ativistas e forjou “quadrilhas”. Nas favelas o
Estado saciou seu desejo pelo sangue de trabalhadores e oprimidos: 13
moradores assassinados no Complexo da Maré, e na Rocinha, o
desaparecimento de Amarildo (caso que ganhou repercussão também nas
ruas).
Nesse sentido, as formas de resistência e
autodefesa do povo contra as opressões são legítimas e não devem ser
criminalizadas. Não são comparáveis com as violências cometidas pelo
Estado, organizadas militar, político e juridicamente, e que contam com
apoio irrestrito da mídia burguesa. Quando a luta se massifica, como foi
o caso da greve dos profissionais da educação, os trabalhadores
precisam defender-se dessa orquestrada repressão policial.
Reconhecemos a importância das
iniciativas de autodefesa do Black Bloc, que cumpre com as necessidades
de resistência nas manifestações e que carrega uma demanda simbólica
contra aquilo que representa o capitalismo e a democracia burguesa.
Estamos atentos à tentativa da mídia burguesa em polarizar os
manifestantes entre “vândalos” e “ordeiros”, e rejeitamos opiniões
generalizadas e conservadoras que desqualificam o papel e a necessidade
de autodefesa nas manifestações. Buscamos realizar uma análise generosa
dos eventos, incluindo todos aqueles que vão às ruas, que se organizam
nas bases, que são militantes de movimentos populares ou organizações
políticas que não se rendem ao governismo e tem enfrentado a força dos
patrões nas ruas. Assim, defendemos que a organização das formas de
autodefesa deve ter o povo e os setores da classe trabalhadora e
oprimida como protagonistas.
Entendemos que a violência do Estado não é
exceção, mas a regra, e seu principal instrumento é a Polícia, seja ela
Civil, Militar ou a Guarda Municipal. Neste sentido, não podemos
enxergar o policial apenas pela esfera econômica, como “trabalhador”
assalariado, sem perceber que há uma indissociável esfera ideológica no
papel desempenhado pela Polícia no sistema de dominação capitalista:
defesa da propriedade privada, controle e assassinato dos pobres e
negros e a repressão a toda organização popular que ameace a ordem
vigente. Diante de causas justas, não houve um recuo dos lacaios do
Estado nas manifestações. Assim acreditamos que defender o policial como
trabalhador assalariado é nutrir ilusões ou ser oportunista.
Nossa posição diante da conjuntura e propostas para avançar
Nós e as demais organizações da CAB,
diante da conjuntura presente nas manifestações ocorridas de junho até o
momento, buscamos participar e ajustar nossas estratégias aos distintos
contextos que se colocam e mudam rapidamente, o que nem sempre é fácil.
Nunca abrimos mão de nossos princípios e seguimos com nosso estilo
militante e concepção de prática política enquanto minoria ativa.
Errando e aprendendo com os erros, acertando e gerando acúmulos.
Diferente das práticas de vanguarda,
nossa minoria é fundamentada na perspectiva de uma “retaguarda”
enraizada, ou seja, propomos estar sempre junto aos oprimidos. Nosso
programa aponta para nossa militância o respeito à autonomia das bases
populares em relação à construção de suas pautas e tomada de decisões.
Atuamos como fermento nas lutas, propondo organizar o que não está
organizado, e ajudando a fortalecer e empoderar os setores populares já
organizados, tendo a autogestão, a ação direta e o federalismo como
métodos. Não delegamos o poder popular, o construímos na luta cotidiana e
junto aos organismos de base, que são o germe da sociedade futura que
queremos cultivar.
Antes uma ação mais modesta, construída
coletivamente, do que propostas mirabolantes realizadas com atropelo e
desrespeito ao protagonismo das bases na organização e na tomada de
decisão. Temos consciência de que não vamos operar sozinhos uma
transformação radical da sociedade, por isso propomos a solidariedade na
luta com outras forças revolucionárias e contra toda forma de
repressão. Para nós, liberdade não significa isolamento. Essa
solidariedade e aliança se dão para nós, prioritariamente pelos
movimentos sociais que ajudamos a construir. Da mesma forma repudiamos
as ações que burocratizam as lutas, deslocando a política da ação dos
organismos de base para a mão de técnicos juristas, economicistas,
burocratas ou políticos. Isso vai minando o protagonismo dos
trabalhadores.
Entendemos que é esse o nosso papel nas
manifestações e nos movimentos sociais que contam com nossa militância,
como o Movimento de Organização de Base (antigo MTD-Pela Base!), o
Movimento Passe Livre – RJ, a Cooperativa Roça, a Associação dos
Produtores Autônomos do Campo e da Cidade (APAC), o Movimento de
Pequenos Agricultores (MPA), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Rio. Fortalecemos
as iniciativas que ajudam a construir a organização e o poder popular.
Compreendemos o anarquismo e a organização política enquanto
ferramentas a serviço da luta pela transformação social, de forma
conjunta com as organizações populares e classistas dos trabalhadores.
Por isso, em modestos passos, mas agindo com qualidade e ética,
caminhamos ombro a ombro com os trabalhadores do campo e da cidade.
Priorizamos levantar as bandeiras dos movimentos sociais e organizações
de base quando participantes de espaços de luta, como: Fórum de Lutas,
Favela Não Se Cala, Fórum Popular de Apoio Mútuo e no apoio à luta dos
profissionais da educação. Atuamos alinhados aos nossos companheiros das
demais organizações integrantes da CAB nas lutas camponesas,
comunitárias, sindicais, estudantis e contra todos os tipos de
opressões. Acreditamos que o anarquismo só faz sentido quando posto em
prática, criando raízes a partir da mobilização popular. Chamamos a
todos que tenham acordo com nossas propostas e que queiram tomar parte
nesse projeto, buscando mobilizar-se nos locais de estudo, moradia e
trabalho. Convidamos a todos para construir um projeto socialista e
libertário de sociedade! Convidamos todos a organizar, com estratégia e
firmeza a luta pela construção desde já, do poder popular!
Lutar, criar, Poder Popular!!!
Viva as manifestações e as lutas do povo!!!
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